Nem Lula nem Bolsonaro?
São eleitores que não votaram em ninguém para presidente da República e representam um dado assustador: nas urnas, somam 500% acima da diferença entre os dois candidatos.
Galvanizar tem o sentido de infundir alguma coisa na alma das pessoas e movê-las a tomar uma atitude, a deixar de se omitir: a ler textos avulsos ou livros; a assistir a filmes, a vídeos e a peças de teatro; a ouvir determinadas músicas; a ajudar o próximo e a praticar a misericórdia, enfim.
E a evitar e a eleger algum candidato. O verbo eleger é do mesmo étimo de ler e tem significados semelhantes a colher e a escolher.
A viagem de galvão e de outras palavras deste étimo é fascinante. Quando os antigos romanos invadiram a Europa, deram com novos vocábulos, é claro, às vezes para designar as mesmas coisas, outras vezes para identificar coisas desconhecidas no Lácio. Foi o caso da palavra do galês “Gwalchmei”, designando um tipo de gavião que aparecia no mês de maio. No alemão, a ave predadora era conhecida por “Gawin”, e no francês por “gauwain”.
Os escritores romanos, alguns dos quais eram militares, como o foi Júlio César com o clássico De Bello Gallico, adaptaram este vocábulo para o latim “galganus”, que depois virou também nome e passou ao português como sobrenome, já alterado para Galvão.
Como alguns dos primeiros nobres portugueses fossem analfabetos, usavam figuras de identificação na heráldica familiar e alguns mandaram ilustrar seus escudos com a imagem de um gavião para designar a família Galvão. Temos o santo brasileiro Frei Galvão, de Guaratinguetá, lembrado por suas pílulas miraculosas, e há várias ruas e logradouros com o nome Galvão pelo Brasil afora, uma delas na Barra Funda, em São Paulo.
No Século XVIII, o italiano Luigi Galvani, também apresentando no sobrenome a derivação do latim, pois o italiano é, como o português, uma língua vinda do latim, usou eletricidade para cobrir um metal com fina porção de outro material. O método passou a ser identificado pelo sobrenome de seu inventor.
No Século XIX, José Martins Fontes, filho de Isabel e do médico Silvério Martins Fontes, já usava o verbo galvanizar num poema: “O luar as cousas galvaniza”. Ele deixou Santos (SP) para seguir a profissão do pai e para isso foi estudar Medicina no Rio de Janeiro. Frequentava a Confeitaria Colombo e se encantou com o poeta Olavo Bilac.
Esses saberes tão saborosos são trazidos a eventuais leitores para que sintam deleite semelhante ao que sentiram os autores que os descobriram e procederam de modo semelhante ao do italiano Galvani, só que para galvanizar as palavras.
Entre esses autores, estão dois escritores do Brasil Meridional que arrebataram o Prêmio Internacional Casa de las Américas, concedido em Havana todos os anos: Walter Galvani, com Nau Capitânia, e o autor destas linhas com Avante, soldados: para trás.
Com orgulho e honra, mas sem vaidade, “há braços” aos eventuais leitores. Tenho mais alegria pelo que leio do que pelo que escrevo.
Deonísio da Silva é professor, escritor, doutor em Letras pela USP e autor também de De onde vêm as palavras (18ª edição, editora Almedina).
Fonte: Revista Oeste