Petrobras: hora de escolher entre janela de privatização ou reforço à máquina pública

A experiência de parar o veículo em uma bomba de abastecimento une boa parte dos brasileiros. Por isso, talvez poucos temas ligados ao governo envolvam tanto interesse popular do que a política de combustíveis. Mas não é apenas o que fala ao bolso que atrai o cidadão para esse debate, há outro ingrediente que torna o assunto único. Afinal, o monopólio da Petrobras sobre o setor mexe com nacionalismo e visão de futuro da nação.

O próximo presidente da República pode ter diante de si uma janela histórica para avançar com a ideia de privatização, ou então para repensar a presença da estatal de economia mista dentro da máquina do governo. Para qualquer dos caminhos, no entanto, o ocupante do Palácio do Planalto precisa dialogar com uma sociedade cada vez mais atenta, que monitora a política de preços e se sente incomodada com o histórico de administração — dos rombos provocados pelos casos de corrupção aos recentes lucros, considerados exorbitantes.

Economia é o tema escolhido por Oeste nesta terça-feira, 9, dentro da série de reportagens “Desafios do Brasil”, que será publicada até o dia 30 de setembro, sempre seguindo a seguinte ordem de temas na semana: segunda-feira (Educação), terça-feira (Economia), quarta-feira (Agro e Meio Ambiente), quinta-feira (Justiça e Segurança Pública) e sexta-feira (Saúde)Veja aqui a reportagem de segunda-feira 8.

A Petrobras atual

Criada em 1953 no governo Getúlio Vargas, a Petrobras nasceu em meio ao clamor nacionalista embalado pelo slogan “O petróleo é nosso”. Hoje, ela pode ser definida como uma empresa de capital aberto, que tem o governo federal como principal acionista, com prioridade no Conselho de Administração e privilégio de indicação de presidentes.

Mesmo assim, a falta de sintonia recente entre a gestão da Petrobras e o governo apareceu de maneira explícita no noticiário sobre combustíveis neste ano. Com o mercado impactado pelas oscilações internacionais, decorrentes da guerra entre Rússia e Ucrânia, os preços foram aumentando gradualmente ao consumidor brasileiro, escalando rapidamente para um cenário de crise.

Ao mesmo tempo, recuperada dos rombos ligados ao escândalo do “Petrolão” na administração do Partido dos Trabalhadores (PT), a Petrobras anunciou lucro de R$ 54 bilhões no segundo trimestre de 2022, atualmente com mais de R$ 100 bilhões em caixa. A aparente contradição entre a saúde financeira da companhia e a dificuldade de consumidores explicitou o incômodo na sociedade.

Em ano eleitoral, o atual governo decidiu reagir em um território em que lhe compete, que são os tributos. Como, por lei, não pode interferir diretamente nos preços cobrados ao consumidor, o Planalto conseguiu passar no Congresso uma limitação à cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICSM) em nível estadual sobre combustíveis, com impacto quase imediato para a sociedade.

Assim, nas últimas semanas, a Petrobras anunciou uma série de reduções de preços de gasolina e diesel — este último é uma commodity que mexe com operações sensíveis, como no mercado de transporte de cargas. O ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, comemorou nas redes sociais comparando os valores brasileiros com os de outros países.

Preço da gasolina no Brasil e no grupo de 7 países mais ricos do mundo! Passo a passo e com a graça de Deus vamos em frente!!! pic.twitter.com/G9Wrksqgdf

— Adolfo Sachsida (@ASachsida) July 29, 2022

No entanto, a manobra tributária praticamente deflagrou uma batalha política com os governos estaduais, que reclamam que não conseguem seguir com as contas em dia com a arrecadação afetada pelo novo teto do ICMS. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF) vem intercedendo a favor de alguns Estados, empurrando a complexidade desse cenário para o período pós-eleitoral e, possivelmente, para o novo mandato presidencial.

O dilema de seguir ou não os preços do exterior

Desde o governo Michel Temer (MDB), o Brasil adotou o Preço de Paridade Internacional (PPI), à época em medida para tentar sanar uma Petrobras quase falida. Havia uma dívida bilionária deixada pela gestão de Dilma Rousseff.

Entre as principais candidaturas à Presidência, existe um sentimento resistente ao modelo vigente. Lula (PT) vem falando em “abrasileirar” a tabela de preços para o consumidor nacional, baseando-se em parâmetros locais, mas ainda sem oferecer muitos detalhes de como poderia colocar a ideia em prática. Já Ciro Gomes (PDT) externou a intenção de limitar a margem de lucro da empresa para no máximo 7% (atualmente está acima dos 30%). Ambos os candidatos ainda manifestaram que são contra ao processo de privatização, que é um desejo de Jair Bolsonaro (PL), em caso de reeleição.

“No curto prazo, o que pode ser feito para enfrentar o atual desafio dos aumentos de preços? Certamente, não é abandonar a política de paridade internacional e muito menos controlar os preços do setor, lembrando que, na última vez em que esse erro foi cometido, no governo da criatura que depois veio a sofrer impeachment, a herança foi um rombo de R$ 40 bilhões. É chegada a hora de abandonar definitivamente os cacoetes intervencionistas que tanto prejudicaram a empresa e os consumidores em suas quase sete décadas de existência”, comentou o colunista Ubiratan Jorge Iorio, na Edição 123 de Oeste.

Em participação em evento na última semana, o atual ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, compartilhou a projeção sobre o horizonte de privatização da Petrobras. O integrante do governo Bolsonaro afirmou que o caminho deve durar pelo menos três anos. Isso, ressaltou, se houver sintonia com a sociedade.

Bolsonaro nomeou Sachsida em maio para Minas e Energia, com a missão de desenrolar a situação da Petrobras, também em uma cartada por um segundo mandato. O novo ministro imediatamente fez avançar o trâmite de desestatização, encaminhando estudos para o Programa de Parceria a Investimentos (PPI), estrutura criada em 2016 com a finalidade de celebrar contratos de parceria com a iniciativa privada e de desestatização.

Mas o caminho promete ser longo e burocraticamente tortuoso. Passando a ser qualificada para o PPI, a Petrobras ainda precisaria ser incluída no Programa Nacional de Desestatizações (PND), o que ocorreria a partir de recomendação do Conselho do PPI e posterior publicação de decreto presidencial, em que constariam prazos para publicação do edital e também para a realização da venda.

A seguir, o governo teria de desenvolver a modelagem financeira da operação, com envolvimento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Depois, o trajeto até a privatização ainda prevê passagens pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Congresso Nacional. Isso sem contar com prováveis embates com servidores da Petrobras, como os sindicalistas da Federação Única dos Petroleiros, que prometem dificultar os planos de desestatização.

Com tantas etapas pela frente, a vontade popular sobre uma empresa que se confunde com o ideal nacionalista é fundamental para fazer qualquer anseio político acontecer.

“A democracia se avança em consensos, não adianta fazer o que eu quero. E isso é a sociedade brasileira que precisa querer. Se houver consenso, é possível avançar”, declarou o ministro Adolfo Sachsida. “Citando (o ex-presidente norte-americano) Ronald Reagan: ‘It’s time to choose’ (É tempo de escolher). É o momento de a sociedade brasileira escolher.”

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Fonte: Revista Oeste


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