O golpe da narrativa do falso golpe

Há um golpe novo na praça. É dizer que houve uma tentativa de golpe. Mais: dizer que houve a intenção subjetiva da vontade de fazer um golpe que jamais foi consumado. Dizer que a intenção de um suposto golpe foi crime passível de prisão e busca de apreensão e perda de bens. É a narrativa golpista que persegue, censura e prende pessoas inocentes dizendo que elas são golpistas. Projeção espelhada que vê e acusa seus próprios erros e crimes nos outros. Freud explica. Lenin endossa: acuse-os do que você é. O golpe, claro, é que de quem acusa o falso golpe. Gostaria de dizer que cai no golpe quem quer. Se você não quiser comprar a narrativa do falso golpe, você pode ser perseguido, preso, censurado, golpeado por aqueles que golpeiam a democracia e a liberdade de expressão e depois dizem que quem reclama é golpista.

O negócio é que querem prender Bolsonaro a todo custo. A todo custo leia-se prender e perseguir todas as pessoas que não corroborem a narrativa de que houve a intenção de uma tentativa de golpe no Brasil. Prender todo mundo que ficou indignado com o golpe da soltura de um corrupto condenado para voltar ao poder; prender todo mundo que pediu providências contra uma Justiça injusta e parcial. Um vídeo divulgado de uma reunião ministerial seria o estopim para novas prisões e buscas e apreensões em nome do falso golpe. Nele, Bolsonaro diz o que todo mundo já sabia que ele sempre disse: que não confiava no sistema eleitoral e nos membros do Tribunal Superior Eleitoral  sendo um puxadinho do Supremo Tribunal Federal (STF) que sempre teve um clima de animosidade com o presidente. Na reunião, Bolsonaro diz que seria preciso fazer algo para coibir algo que pudesse dar ensejo a uma eleição manipulada e uma possível revolta popular após as eleições diante da tal manipulação. Você, leitor não golpista, pode crer ou não nas palavras do presidente, mas o fato é que nada do que ele disse traduz uma tentativa ou intenção ou mesmo execução de um golpe que, aliás, nunca veio. Falar mal de pessoas dentro das instituições é um direito que assiste qualquer cidadão numa democracia. Desconfiar, esculhambar, dizer mal de agentes públicos é um direito de qualquer cidadão. O próprio Alexandre de Moraes assegurava este direito quando poucos anos atrás disse que agente público deve se submeter a criticas, ainda que sejam agressivas ou levianas. Foi isso que o general Heleno fez quando desaforou agentes públicos e disse que deveriam virar a mesa antes de supostas eleições manipuladas. Democracia crítica, muitas vezes leviana. Democracia tagarela. Se alguém se sente ofendido ou caluniado, que recorra a medidas legais de processo. Agora, prender, perseguir, arruinar pessoas ou mesmo o presidente da República, por desconfiar de um dos Poderes, é crime? Crime é criminalizar a crítica e a desconfiança numa democracia. Numa democracia onde não mais estamos, por óbvio.

Bolsonaro falou em manipulação, traduzindo inúmeras possibilidades ou mesmo uma profecia, ou mesmo uma acusação leviana. Nada disto se traduz em real tentativa de golpe, que nunca se consumou. Por manipulação, um cidadão livre poderia supor que censurar um candidato de dizer que Lula era amigo de ditadores ou defensor de aborto, ou ladrão, ou a Justiça Eleitoral ter proibido Bolsonaro de usar imagens da comemoração do Sete de Setembro, ou seu discurso na ONU, ou imagens da sua primeira dama, ou mesmo multar o Partido Liberal (PL), do presidente, de reclamar por inserções de rádio perdidas no Nordeste. Isto indicaria a possibilidade não necessariamente de fraude, mas de uma parcialidade da Justiça Eleitoral que esboçou uma preferência por um determinado candidato. Por falar em PL, o presidente do partido, Valdemar da Costa Neto, foi preso nesta nova levada de prisões. Motivo: uma arma aparentemente ilegal e uma pepita de ouro encontradas em sua casa. Coincidência, claro. Isso tudo às vésperas das eleições municipais, quando tudo indica que Bolsonaro poderia ser o maior cabo eleitoral de candidatos conservadores. Os advogados de Bolsonaro foram proibidos de se comunicarem entre si. Bolsonaro não pode se comunicar com seus assessores porque estão presos ou foram proibidos de se comunicarem entre si. A expressão “nos derrotamos o bolsonarismo” vinda da boca de um dos ministros do STF ganha corpo nas perseguições surrealmente descabidas numa democracia, porém, perfeitamente normalizadas numa ditadura que se traveste de democracia, que é onde mora o Brasil no momento.

Na rede Globo, a torcida fica indisfarçável. A jornalista Eliane Cantanhêde chega a dar o cronograma da prisão do ex-presidente. Diz que a Polícia Federal está colhendo todas as provas e evidências para efetuar a prisão do ex-presidente para convencer a população que ainda desconfia de sua culpa. Rede Globo não só pré-julga como já condena, anuncia, endossa a prisão de Bolsonaro e ainda indica o caminho de convencimento da população de que a prisão dele é justa e legal. Jornalismo inquisitorial que atua como carrasco e manipulador da própria população. Ditadura perfeita que tem o endosso da grande mídia e a omissão do Congresso.

No Parlamento, as mesmas máximas de desespero de uns e outros. Parlamentares se perguntam pela milionésima vez onde vamos parar. Já paramos, uai. Numa ditadura. Todos sabem. Jornalistas informam os fatos e nada fazem para mudar os fatos.

O fato é que a direita brasileira inteira está sendo criminalizada por uma suposta intenção de um golpe que nunca houve. Somada à criação de uma intenção, está a invasão do Congresso por baderneiros que até agora nada se provou de vínculo direto com uma intenção golpista que nunca ficou minimamente clara em nenhuma palavra do ex-presidente Bolsonaro. A baderna foi de gente desesperada com a tomada do poder por corruptos condenados e juízes carrascos. Mas a interpretação criativa dos juízes supremos podem fazer as mais múltiplas conexões interpretativas. Se alguém falou mal de um ministro, é um antidemocrático incitador do golpe que nunca veio. Se alguém falou em urnas auditadas por voto impresso e colocou em dúvida o processo eleitoral, é acusado de desinformação que provocaria a insurreição golpista. Se alguém pagou a passagem para sua tia idosa protestar no 8 de janeiro em Brasília, é responsável e patrocinador financeiro por uma baderna aberta pela falta de guarnição policial que permitiu os baderneiros de entrarem na praça dos Três Poderes para ativar um golpe sem armas, sem apoio político, sem militares, sem articulação. Tudo isto, na cabeça dos juízes supremos, estimulado primeiramente por Bolsonaro. Enquanto isso, pessoas, cidadãos, jornalistas, padres, pastores, humoristas, são presos, censurados e arruinados por esta narrativa esquizofrênica. A narrativa golpista que acusa pessoas da intenção de um golpe que nunca aconteceu, que criminaliza a maioria da população de um país que vê apavorada a destruição da democracia no país por um golpe dado de dentro das instituições. 

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Fonte: Revista Oeste


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