Será que Bolsonaro conquista ou perde voto com os ataques que faz ao politicamente correto?
Como você tem se comportado com essa história do politicamente correto? Já usou alguma palavra ou expressão que consideraram agressivas e teve de se desculpar e mudar a forma de se comunicar? Tem se sentido inseguro por não saber exatamente como falar e fica com receio de se manifestar de maneira inconveniente? Bem, se a resposta for sim, bem-vindo ao clube. Não é fácil. Algumas pessoas ficam perplexas quando são censuradas: Ei, você não pode dizer “denegrir”. Como você ainda fala “criado mudo”? Não sabe que “mulato” é ofensivo? Que grosseria é essa de usar a expressão “mentirinha branca” ou “lista negra”? Pronto! A polêmica está armada.
Uma das pessoas que mais têm combatido esse uso da linguagem vigiada é o presidente Bolsonaro. Ele já afirmou: “Não sou politicamente correto. Eu sou um brasileiro correto como a maioria de vocês, ou quase todos vocês”. É um paradoxo. Bolsonaro conquista eleitores por afirmar que não é politicamente correto, e, ao mesmo tempo, perde boa parte do eleitorado por esse mesmo motivo. Muitos dizem que votaram nele pelo fato de ele não se curvar ao mi-mi-mi, enquanto outros afirmam que esse comportamento desrespeitoso os impede de serem seus eleitores.
Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Sabemos que, ao nos comunicar, deixamos transparecer os nossos valores, nossa história de vida, a posição social que ocupamos. Em outras palavras, a forma como nos expressamos diz muito sobre as narrativas que absorvemos e que fundamentam o que somos e como somos. Se conseguirmos entender a dinâmica que acontece no jogo social, teremos a chance de nos relacionarmos com mais eficiência e autenticidade. A comunicação será, por isso, instrumento poderoso na busca da igualdade, da liberdade e da inclusão em nosso meio social. E sempre trará à tona os conflitos que se seguem nessa busca. Por isso, quando o presidente faz a sua declaração sobre o politicamente correto, temos pela frente questões importantes que precisam ser consideradas.
Há hoje em dia um patrulhamento que chega a ultrapassar certos limites do bom senso. Ter de escolher palavras e substituir vocábulos toda vez que precisar falar ou escrever é uma pressão que acaba por inibir as ações e limitar a liberdade de expressão.Tenho discutido esse tema com frequência em minhas aulas. Percebo a preocupação e até a indignação dos alunos frente ao radicalismo na defesa do politicamente correto. Praticamente todos concordam que ofensas devam ser coibidas, injustiças, corrigidas e respeito ao próximo, estimulado, mas muitos se revoltam com o exagero. Dizem ser inadmissível, por exemplo, não poder se referir a Deus como “Ele”, pelo fato de alguns dos defensores do politicamente correto advogarem a ideia de que o Ser Supremo não é um homem. Por que, então, se referir a Ele no masculino?!
Ouvi uma história que me chocou. Um humorista fez autogozação com o fato de ser obeso. Uma pessoa que assistia à apresentação dele subiu ao palco e o agrediu fisicamente por ter se sentido ofendida. Não poder brincar com as próprias características físicas ultrapassa todas as fronteiras da sensatez. Um fato ainda mais marcante foi o de um comentarista esportivo na Copa do Mundo criticar o jogador Neymar porque havia humilhado um adversário com seus dribles. Pois é, era só o que faltava, levar para o campo de futebol o politicamente correto. O que seria de Garrincha, “a alegria do povo”, se fizesse hoje o que fazia com seus dribles, transformando cada um de seus marcadores em “João”?
Certamente, levar esse assunto a ferro e fogo pode tirar a liberdade de as pessoas se expressarem, e, talvez, até criar obstáculos para a boa convivência. Exageros à parte, o respeito para com o outro, entretanto, precisa e merece ser levado em conta. Tomar alguns cuidados com o que falamos é prudência e sabedoria que todos devemos cultivar. Incluí em minhas aulas de oratória recomendações de como evitar mensagens que possam ser ou soar agressivas. Chamo a atenção para o fato de que devemos evitar romper essa delicada linha amarela. Além de ser a fronteira rumo à agressão ao próximo, pode também representar o passo em falso que prejudica a própria imagem de quem se comunica.
Rei
Temos de observar sempre o antigo lema atribuído a Herbert Spencer “A minha liberdade termina quando começa a liberdade do outro”. Se não tivermos consciência dos limites entre o exagero e a responsabilidade no uso das palavras, corremos o risco de nos reprimirmos de um lado, e de provocar dissabores de outro. E o comportamento de Bolsonaro? Se essa for uma medida para merecer ou não o voto do eleitor, cada um deve decidir o que julgar mais conveniente. Ele é bastante experiente e sabe das consequências de suas palavras. Imagino até que não faça nada por acaso. Siga pelo Instagram: @polito.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
Fonte: Jovem Pan