‘Vou pegar meu recurso e tirar do País’, diz empresário que teve negócio desfeito com a Petrobras; veja entrevista

Controlador do grupo cearense Grepar, o empresário Clovis Fernando Greca promete brigar com a Petrobras na Justiça por uma indenização. No ano passado, sua empresa havia acertado a compra, por US$ 34 milhões (R$ 167,3 milhões), da Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor). Na segunda-feira, 27, a estatal anunciou que rescindiria o contrato, alegando que algumas condições precedentes para transferência do ativo não foram concluídas até o prazo final de 25 de novembro deste ano.

Em entrevista ao Estadão, o empresário critica o posicionamento da Petrobras, a qual, segundo ele, teria feito de tudo para que os prazos não fossem cumpridos. Segundo o empresário, a petrolífera “desistiu de fazer negócio”, desde quando o governo mudou.

Por meio de nota, a Petrobras alega que o contrato foi rescindido “em razão da ausência de cumprimento de condições precedentes nele estabelecidas até o prazo final definido em tal contrato (25/11/2023), em que pesem os melhores esforços empreendidos pela Petrobras para conclusão da transação”.

Agora, com a frustração do processo, Greca avisa que não vai mais investir no Brasil. “Vou pegar o meu recurso e tirar do País”, afirma o empresário. “Vou investir em outros lugares, que queiram ter empresariado fazendo investimentos sérios.”

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Ela simplesmente desistiu. Desistiu de fazer negócio, de um contrato no qual não pode ter desistência. Ela não decidiu fazer isso agora. Decidiu quando um novo governo assumiu. O propósito era desfazer o contrato. O que o governo anterior fez, o atual quer desfazer. Não interessa se a coisa é boa ou não. Se a coisa está correta ou não. O viés ideológico é diferente. (O governo atual) é contra qualquer venda de qualquer ativo. Estamos num momento de Estado muito mais atuante na economia. Tudo contra esse sentido o governo não quer fazer. Por isso, a Petrobras desistiu de um contrato que não permitia a ela este poder.

Ela foi enrolando, criando desculpas, fingindo que estava avançando. O pessoal da Petrobras, de níveis inferiores, estava fazendo o que precisava acontecer. Mas a direção da empresa já havia decidido que não iria finalizar o negócio.

Todos os contratos preveem condições precedentes, que cada parte precisa cumprir. São condições para quem está vendendo e para quem está comprando. E são estabelecidas as condições obrigatórias e outras das quais se pode abrir mão. Uma condição que eu tinha que atender era ter a compra aprovada pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), e isso aconteceu. Eu não podia abrir mão disso. Era obrigatório. Pelo lado da Petrobras, existia a condição de ela fazer os aportes dos ativos, de fazer a transferência de todos os imóveis para a nova empresa. Da parte da Grepar, cumprimos todas as condições que deveríamos completar. Restaram as condições que a Petrobras tinha de cumprir. Entre elas, estava a regulação fundiária da refinaria. Parte do terreno pertence ao município de Fortaleza. A Petrobras está lá instalada por que o município fez uma cessão gratuita para ela. Outra parte do terreno pertence à União, também com cessão gratuita. Então, ela tinha de transformar essas duas cessões gratuitas em onerosas. É um processo mais do que normal.

A gente informou que queria receber a refinaria com o terreno regularizado, mas que, se não desse tempo de completar o processo, poderíamos assumir a responsabilidade de fazer isso depois de assumir a refinaria. Era uma obrigação precedente da qual eu poderia renunciar. Eu sempre acreditei que nunca alguém iria retirar uma refinaria instalada do local. Então, seria só uma questão de burocracia e de tempo para vencer essa questão. Como o prazo final estava chegando e notamos que a Petrobras estava enrolando e não avançando, percebemos que havia boi na linha. Então, a Grepar avisou para a Petrobras que abria mão das condições precedentes fundiárias. Ela poderia resolver todas as outras condições exclusivamente da responsabilidade dela, que não envolveria terceiros. A Petrobras respondeu que não poderia aceitar a renúncia das condições por que não poderia vender patrimônio que não era dela. Mas nós não estávamos pedindo para ela vender esses terrenos. Aceitávamos receber o imóvel da mesma forma com que a Petrobras ocupa o local. Ela foi me enrolando, deixou vencer o prazo e disse não reconhecer o meu direito de abrir mão dessa condição precedente. Como as condições não foram implementadas, o prazo venceu, ela pediu a rescisão do contrato. A Petrobras não poderia ter pedido isso por que quem deu causa ao atraso foi ela, e essas condições fundiárias não precisavam ser cumpridas. Existiam outras condições, sigilosas, que a própria Petrobras deveria ter realizado. Quem dá causa ao inadimplemento do contrato não pode pedir a rescisão.

Se não querem vender, eu também não quero comprar mais. Não tem problema. Vamos tomar as medidas jurídicas cabíveis. Se a Petrobras quiser voltar atrás, eu estou apto. Mas aí seria do desejo dela que eu assuma a refinaria, o que eu acho muito improvável.

É um projeto com o qual estou há quatro anos envolvido. Em média, havia 50 pessoas trabalhando do nosso lado, nesse período. É uma unidade que dá prejuízo para a Petrobras, porque é muito pequena para ela. Representa 0,5% do seu refino. A Lubnor não refina gasolina ou diesel, mas sim petróleo para asfaltos. Proporcionalmente, a Lubnor representa pouco para a Petrobras. Ela não tem como administrar para que seja rentável. Para reverter isso, investimos em muito estudo. Estava previsto mais de US$ 100 milhões em investimentos. A gente ia aumentar a planta. A sociedade brasileira iria ganhar, assim como o setor de asfaltos. Todo mundo sairia ganhando. A gente perdeu muitas outras oportunidades como empresário. Eu estava focado nisso, eu tinha gente voltada para isso, e o meu recurso estava disponível para o projeto. Havia outros projetos em voga. Mas, a partir do momento que assinei uma carta com um contrato vinculante, e cumpri a minha parte, deixei de investir em inúmeros outros projetos. Com isso, acredito que a gente deva ser indenizado por todo esse prejuízo, por todo esse tempo de frustração, e pela perda de investimentos e oportunidades que tivemos.

Eu me encaro exatamente como o empresário que o Brasil gostaria de ter. O próprio presidente Lula falou que quer o empresariado brasileiro com recurso e investindo em negócios, e fazendo o Brasil crescer. Eu me enxergo desse jeito. O meu investimento é próprio. Sou um empresário brasileiro tentando fazer o Brasil crescer. Mesmo assim, e, depois de tanta luta, o empresário sofre o que eu sofri. Isso mostra que o Brasil não é nem para o brasileiro, nem para o empresário brasileiro. Quem que o Brasil quer que invista aqui? Estou tentando tirar dinheiro do banco para colocar na indústria produtiva, mas não posso fazer isso por causa de um idealismo completamente equivocado.

Pelas dificuldades que tivemos, sim. Fizemos pedidos de regularização há muito tempo. Como são governos da mesma linha filosófica (Fortaleza é comandada por José Sarto, do PDT), nenhum deles quis deixar o processo avançar. A Prefeitura de Fortaleza, depois de muito esforço da nossa parte, concordou em fazer a venda (o Estadão procurou o governo local, mas não obteve resposta). O terreno da prefeitura eram antigas ruas desativadas. A gente propôs muitas coisas, como trocar isso por área contígua. Mas eles não queriam. A gente conseguiu uma resposta positiva apenas de fazer a compra das ruas. A gente compraria e pagaria muito caro por isso. Mas há uma burocracia e leva um tempo para concluir o processo. Já na União as dificuldades foram outras. Inclusive, parte das dificuldades foi criada pela própria Petrobras, para o processo não avançar na União.

Vou pender para não investir mais no Brasil. Vou pegar o meu recurso e tirar do Brasil. Vou investir em outros lugares, que queiram ter empresariado com investimentos sérios, de gente que quer construir algo. Infelizmente, o Brasil, em termos de amistosidade com o empresariado, está em fim de linha agora. O nosso viés não é político. O meu viés é de produtividade, de fazer a coisa com eficiência. Eu não tenho nenhum alinhamento político. Quero produzir, fazer as coisas da melhor forma possível.

Estadão

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Fonte: TBN


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