Rachado, PSDB sai das prévias com a missão de retomar protagonismo e bandeiras históricas da sigla

PSDB/Twitter/ReproduçãoEduardo Leite, Arthur Virgílio e João Doria disputam quem vai ser o nome do partido na corrida pela Presidência da República em 2022

Na manhã desta sexta-feira, 26, o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, anunciou que as prévias do partido, criadas para a escolha do candidato da sigla à Presidência da República em outubro do ano que vem, foram retomadas na manhã deste sábado, 27. A expectativa, disse o cacique, é que o nome escolhido pelos tucanos seja divulgado até o final do dia. Disputam o pleito os governadores de São Paulo, João Doria, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e o ex-senador e ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio Neto – os dois primeiros polarizaram a disputa. Independentemente do resultado, o vencedor sairá do processo com uma difícil missão: acalmar os ânimos de uma sigla rachada e tentar se cacifar como um candidato competitivo para o pleito de 2022.

A crise que atinge o PSDB não foi iniciada com as prévias, mas a suspensão do processo de votação, motivada por um problema no aplicativo, foi o estopim para uma série de troca de acusações entre duas alas importantes do partido. Arthur Virgílio, que disputa a eleição, mas não tem chance de vitória, chamou o deputado federal Aécio Neves (MG) de “maçã podre”. Virgílio representa um setor do tucanato que enxerga o correligionário mineiro como o responsável por tentar arrastar a sigla para o Centrão, grupo político cujo núcleo duro é formado por PL, PP e Republicanos. Ao longo da campanha, Neves foi acusado de tentar boicotar o pleito interno. De acordo com a versão de seus adversários, caso o PSDB não tenha um candidato à sucessão presidencial e concentre energia na eleição para o Parlamento, a legenda terá condições de expandir a bancada federal e exercer influência sobre o novo governo. Em nota, Aécio retrucou e afirmou que o ex-prefeito é “laranja do Doria”.

Aécio, aliás, é uma figura relevante neste processo ao qual o PSDB está submetido. Com Fernando Henrique Cardoso, o partido comandou o país por dois mandatos. Na sequência, os ex-governadores Geraldo Alckmin e José Serra polarizaram com o PT em três eleições: 2002, 2006 e 2010. Em todas essas ocasiões, os petistas foram vencedores. Em 2014, o agora deputado federal disputou o segundo turno com a então presidente Dilma Rousseff. Em uma eleição apertada, o tucano conquistou mais de 51 milhões de votos e foi derrotado por margem estreita: 3,28% dos votos válidos. Apesar do revés, o neto de Tancredo Neves se credenciava com uma das principais lideranças da oposição ao petismo. Menos de três anos depois, em maio de 2017, o então senador foi flagrado em uma gravação com o empresário Joesley Batista, da JBS, na qual o parlamentar acerta o recebimento de R$ 2 milhões para o pagamento de seus advogados. No ano seguinte, com a imagem arranhada, Neves disputou e conquistou uma cadeira na Câmara. Também em 2018, Alckmin representou os tucanos na corrida pelo Palácio do Planalto, mas amargou um pífio resultado: 4,76% dos votos.

Para o cientista político Alberto Carlos de Almeida, do Instituto Brasilis, a derrocada do PSDB está relacionada à decisão do partido de apoiar o governo Michel Temer (MDB), que assumiu o país após o impeachment de Dilma Rousseff. “Depois do resultado da eleição de 2014, Aécio aparecia como principal opositor de um governo muito desgastado. Ele poderia esperar quatro anos e disputar o pleito de 2018 como protagonista. Mas o PSDB decide apoiar a queda de Dilma e embarca no governo Temer. Neste momento, o PSDB deixa de ser estilingue e passa a ser vidraça. Antes do impeachment, os tucanos eram oposição a um governo muito mal avaliado. Depois, ele se torna parte do governo Temer, o que teve a pior avaliação desde Collor. Em 2018, o eleitorado vê PSDB e MDB unidos e decide apoiar alguém que nunca governou. Este eleitorado do PSDB foi inteiramente transplantado para Bolsonaro”, avalia.

A queda do rendimento nas urnas não está restrita apenas a nível nacional. Na eleição de 2006, o PSDB tinha 66 deputados federais. Em 2014, 54. Atualmente, 33 parlamentares representam o partido na Câmara dos Deputados. Agora, a sigla corre o risco de assistir a uma debandada. Segundo apurou a Jovem Pan, cerca de 10 deputados e um senador pretendem deixar o tucanato. No domingo, 21, durante a votação das prévias, a deputada Mara Rocha, do Acre, gritou “sou Bolsonaro” e anunciou que vai se filiar ao PL, de Valdemar Costa Neto. Além do constrangimento, o anúncio causa incômodo na cúpula da legenda porque ilustra o fenômeno da “bolsonarização” do PSDB, segundo definiu o ex-senador Arthur Virgílio. Nos últimos meses, a maioria da bancada tucana tem votado em sintonia com o governo Bolsonaro. No início de setembro, a Executiva Nacional declarou oposição ao Planalto. Mesmo assim, na madrugada do dia 4 de novembro, 22 dos 31 deputados foram a favor da PEC dos Precatórios, que adia o pagamento das dívidas da União reconhecidas pela Justiça e altera a regra do teto de gastos.

“Certos posicionamentos adotados aqui ou acolá, por representantes ou parlamentares, são impensáveis e inaceitáveis. Isso não coaduna e não sintoniza com a nossa história”, afirmou à Jovem Pan o senador José Aníbal (PSDB-SP). O parlamentar apresentou um texto alternativo à PEC dos Precatórios, proposta com a qual não concorda. “O governo quer legalizar o calote nos brasileiros, nos trabalhadores que esperam há 20, 30 anos para receber. Quando assino a proposta alternativa com outros dois senadores, estou mostrando o caminho que o PSDB deve seguir. Não temos nada a ver com esse governo, que desagrega e foi incapaz de fazer o que prometeu. Bolsonaro é um pastiche do que se apresentou nas eleições de 2018. No fundo, ele só criou conflito e tensão na sociedade”, acrescenta. Aníbal reconhece que a suspensão das prévias representou o anticlímax, torce para que o partido supere “o ambiente de agastamento” e defende a construção de “uma candidatura que não polariza e que foca nos desafios do Brasil”.

“O PSDB ousou e trabalhou em um processo genuíno de democracia interna. Em uma corrida com essa intensidade, é natural que haja farpas dentro das quatro linhas. Há pessoas que não querem candidatura própria para expor o partido e prejudicá-lo. O PSDB vive um momento de intensa mobilização e, mesmo com a falha no aplicativo e com os excessos políticos, seremos o primeiro partido que escolhe seu candidato com diálogo”, afirmou à Jovem Pan o presidente do diretório paulista do PSDB, Marco Vinholi. “A união do partido vai acontecer pelo esforço do vencedor e pelo compromisso daqueles que são do PSDB e que querem construir o partido do futuro. O PSDB não tem nenhuma relação com o que se transformou o bolsonarismo. Temos diferenças incompatíveis e o nosso candidato à Presidência vai liderar um processo de aglutinação das forças de centro, distante dos dois extremos”, acrescenta o secretário de Desenvolvimento Regional do governo Doria.

Aníbal, que apoia o governador Eduardo Leite, e Vinholi, aliado de Doria, estão em lados opostos na disputa interna, mas apostam suas fichas no sucesso do PSDB na eleição presidencial do ano que vem. A menos de um ano do pleito, porém, os tucanos ainda não levantaram voo. Segundo pesquisa Datafolha divulgada no mês de setembro, os dois gestores aparecem com 4% das intenções de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do presidente Jair Bolsonaro e do ex-ministro Ciro Gomes (PDT). Levantamento do Paraná Pesquisas divulgado na segunda-feira, 22, mostra um cenário ainda mais adverso. Com o ex-juiz Sergio Moro (Podemos) incluído nos cenários, Leite tem 1,6%; Doria, 3,1%. “Pelo cenário apresentado até aqui, o PSDB sai das prévias dividido, cada um fazendo o que quiser. Partido dividido, cúpula dividida. Isso é muito ruim. Na eleição presidencial, não irão se recuperar e também perderão deputados. Na minha avaliação, o golpe fatal para os tucanos seria perder o governo do Estado de São Paulo, uma eleição crucial”, diz Alberto Almeida.

Segundo pesquisa Datafolha, divulgada em setembro, o vice-governador paulista, Rodrigo Garcia, recém-filiado ao PSDB, aparece com 5% dos votos, atrás do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas (sem partido), Guilherme Boulos (PSOL), Márcio França (PSB) e Fernando Haddad (PT). Neste cenário, Garcia não aparece na disputa com o ex-governador Geraldo Alckmin, que está de saída do tucanato, mas lidera, com 26%, a corrida pelo Palácio dos Bandeirantes em outra simulação. “Depois do esforço de Doria para trazer o Rodrigo para o PSDB, perder a eleição para o Alckmin, um tucano histórico, seria mais do que irônico. Seria o golpe de misericórdia para todos nós do partido”, sentencia uma importante liderança da sigla. Este é o desafio do PSDB.


Fonte: Jovem Pan


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