Arrecadação do imposto do ouro na Amazônia Legal subiu 111% sob governo Bolsonaro

Incentivos do governo Jair Bolsonaro (PL), diminuição da fiscalização ambiental e aumento de preços durante a pandemia de covid-19 estão por trás da corrida pelo ouro que se instalou na Amazônia Legal, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A arrecadação do imposto recolhido pela exploração do ouro subiu 294,7% nos últimos cinco anos nos estados que compõem a Amazônia Legal. No mesmo período, em todo o país aumentou 153,4% o recolhimento da chamada Compensação Financeira pela Exploração Mineral. O dado faz parte do estudo Cartografias da Violência na Amazônia.

Na gestão Bolsonaro (2019-2022), o aumento da arrecadação do imposto foi de 111,2% na região. O montante passou mais de R$ 80 milhões no primeiro ano de governo para mais de R$ 170 milhões, em 2022. Nesse período, o crescimento do tributo em todo o país foi 79,1%.

Os dados mostram que, em 2021, a arrecadação do ouro na Amazônia significou 47% do total nacional — o equivalente a R$ 200 milhões. No Pará, o imposto atingiu o ápice histórico — R$ 86 milhões, aumento de 485% em relação a 2018.

A ideia do imposto é que ele seja pago ao município onde ocorreu a exploração para reparar danos. “Boa parte desse imposto, porém, está vindo de extração que nem sequer é permitida”, afirma Betina Barros, pesquisadora do Fórum.

Há relatos de garimpeiros da região de que a quantidade de ouro extraída é muito superior à dos registros oficiais. “Existe uma grande dificuldade para medir a extração”, diz Rodrigo Chagas, pesquisador do Fórum e professor da Universidade Federal de Roraima.

A preocupação de entidades locais é que o aumento da extração impacta áreas de conservação. “Nos últimos quatro anos, a área de garimpo de ouro aumentou. Era esperado que a produção e a arrecadação também aumentasse”, afirma Estevão Senra, pesquisador do Instituto Socioambiental. “Porém o aumento se deu também em regiões em que o garimpo é ilegal, como terras indígenas.”

É possível observar um crescimento contínuo que atinge o ápice em 2021 e depois uma leve queda em 2022. O recolhimento [de imposto] mostra o aumento de uma exploração, que pode ser legal, mas também tem uma parte ilegal.

Não me parece que o imposto dê conta de reparar danos como a contaminação por mercúrio no rio Tapajós, além dos efeitos da devastação e do desmatamento. É ilusório acreditar que o imposto será suficiente para compensar todos esses danos.Betina Barros, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

O ouro extraído em territórios legais ou ilegais é vendido em Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM). Nesse momento, segundo Betina, os garimpeiros precisam apresentar a Permissão de Lavra Garimpeira (PVG) e documentos de identificação. “Não há um grande cuidado para verificar essa documentação, o que acaba fragilizando toda a cadeia”, diz ela.

Em abril, o ministro Gilmar Mendes, do STF, suspendeu a instituição da presunção da “boa-fé” no comércio do ouro — que permitia o comércio apenas com base nas informações dadas por vendedores do produto.

A decisão estabeleceu um novo marco para a fiscalização do comércio do ouro. “O principal impacto da decisão é que o mecanismo da boa-fé deixa de existir, o que é positivo e indica uma melhoria na fiscalização”, afirma Betina.

Após ser comprado pelas distribuidoras, o ouro é encaminhado ao Banco Central. “A nota fiscal é o único documento que acompanha essa movimentação, diferentemente da madeira que tem um documento específico para identificar a origem. No caso do ouro, isso não existe”, diz Betina.

As falhas de regulação na cadeia facilitam o esquentamento do ouro e a existência de garimpos fantasmas. Provavelmente, parte desse ouro que contribuiu para o aumento da arrecadação é ilegal.Estêvão Senra, pesquisador do Instituto Socioambiental

Municípios que possuem frentes de garimpagem possuem o Índice de Progresso Social (IPS) 4% menor do que a média amazônica e 20% abaixo do índice nacional. O dado faz parte de um estudo realizado pelo Instituto Socioambiental, que relacionou dados do Índice de Progresso Social (IPS) e do garimpo na Amazônia Legal.

A corrida pelo ouro se reflete no garimpo e no narcogarimpo. Senra, do Instituto Socioambiental afirma que a atividade está associada ao aumento de doenças, de trabalho escravo e exploração sexual. “Tudo isso contribuiu para a deterioração da qualidade ambiental e do bem-estar das cidades, diz o pesquisador.

Corrutelas são estruturas montadas no entorno das frentes de garimpagem — nesse locais costumam ocorrer crimes como homicídios, roubos, exploração sexual e comércio de drogas. Dados do Fórum mostram que a taxa de mortes violentas de mulheres na Amazônia foi de 5,2 por 100 mil mulheres, 34% superior à média nacional, de 3,9 por 100 mil.

A presença de facções criminosas em áreas de garimpo eleva a violência. “Os garimpeiros entram em terras indígenas em grupos de poucas pessoas para negociar. Já os integrantes da facção entram com fuzis, metralhadoras e não querem negociar. Eles mudam a lógica do garimpo”, afirma o pesquisador.

O UOL procurou a Agência Nacional de Mineração, mas não teve retorno.

Os registros de crimes vinculados ao desmatamento cresceram 85,3% entre 2018 e 2022. Segundo o levantamento do Fórum, foram 619 registros nas polícias civis dos estados que compõem a Amazônia Legal.

Delitos relacionados ao comércio de madeira também aumentaram: o crescimento foi de 37,6% entre 2018 e 2022. Os registros subiram de 149 para 205. Só o estado do Amazonas reúne 91 registros.

Incêndios criminosos na região aumentaram 51,3% no período analisado. O estudo do Fórum aponta que em 2022 foram registrados 581 incêndios e o maior número de registros foi em Mato Grosso, com 240 ocorrências.

Há dificuldade em responsabilizar criminalmente grandes garimpeiros por meio de leis ambientais, “Não adianta criminalizar milhares de garimpeiros, normalmente migrantes mais vulneráveis. É preciso que os esforços das polícias sejam sobre os financiadores.”

UOL

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Fonte: TBN


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